domingo, 13 de abril de 2008

O Infinito Potencial pt. 1

Apesar de no momento nao poder escrever com a regularidade que talvez gostaria, vou fazer um esforco pra terminar apropriadamente a nossa saga. O infinito é na verdade um assunto bastante extenso e apesar de interessante, corro o risco de passar muito tempo com ele, portanto nao dá pra me comprometer muito. Mas se alguém quiser realmente se aprofundar, aconselho dar uma boa espiada num bom livro de "Análise" (um dos ramos da matemática), pois como Hilbert (um dos grandes matemáticos do século passado) mesmo disse: "Em certo sentido, a Análise nao é nada menos do que uma sinfonia sobre o tema do infinito". Alerto no entanto que nao é lá o tipo de leitura que se faz antes de dormir. Seja como for, se conseguir despertar algum interesse com esses poucos posts, já me dou por mais que satisfeito.

Depois de esgotar o usual repertório de besteirol na volta de um show de rock semana passada, eu tentava convencer um amigo da relacao entre a estrutura do Universo e a música, usando como evidencias a hipótese de Riemann e a teoria das cordas. Para quem nao conhece, a hipótese de Riemann é um dos mais famosos problemas nao resolvidos da matemática. Ela prove uma interpretacao geométrica e elegante para a distribuicao dos números primos, onde eles correspondem aos zeros de uma funcao matemática chamada "zeta" e aparecem na forma de frequencias harmonicas. Já a teoria das cordas é um esforco teórico no sentido de acomodar as disparidades entre a relatividade geral e a física quantica. Na teoria das cordas, os átomos nao assumem mais a forma de partículas, mas cordas que vibram numa certa frequencia, como as cordas de um piano por exemplo. Conversa meio torta pra um final de noite, mas como dito antes, já nao tinha muito mais sobre o que falar. O meu amigo me rebateu dizendo uma coisa interessante que serviu pra relembrar o fato de que as vezes a nossa intuicao nao é suficiente: "Cuidado, a gente tem a mania de sempre procurar relacoes com coisas que nos sao familiares". Nesse caso particular ele se referiu a música, mas a mensagem é mais ampla. Ela implica no fato de termos a tendencia de querer que tudo faca sentido segundo a natureza tal como a observamos, esquecendo que o Universo é muito mais amplo e complexo do que esse pequeno subconjunto chamado Terra. A teoria do Big Bang por exemplo. Pelo fato de tudo que nos cerca ser finito, se desenvolveu uma teoria para o Universo segundo a qual ele também tem um comeco e fim (na verdade a teoria é mais voltada para o comeco). Nao que a teoria esteja certa ou errada, nao há como saber, mas o fato dela ser amplamente aceita, se deve em parte à sua concordancia com a idéia de finitude. Tenho que admitir que parece meio bizarra a idéia do Universo nao ter um comeco ou fim. Tentem pensar a respeito como exercício. Mas porque seria tao difícil aceitar tal idéia afinal? O Oráculo responde: "Tudo que tem um comeco, tambem tem um fim Neo" (cena do filme "Matrix Revolutions") ;)

Sendo assim, parece nao fazer muito sentido eu dizer que o infinito representa um papel importante na natureza já que no nosso mundo ele nao acontece. De fato, depois do tradicional blablabla inicial estamos finalmente chegando ao ponto. O que talvez faca mais sentido para nós, seja a idéia de um infinito potencial, ou seja, um infinito que pode nao necessariamente acontecer, mas que tem o potencial de acontecer. A diferenca é sutil mas importante. Tomemos um andarilho hipotético como exemplo. Se desconsiderarmos limitacoes físicas e biológicas, independente de quantos passos ele tenha dado, ele sempre será capaz de dar mais um passo. A mesma coisa com o conjunto dos números naturais, por exemplo, pois independente do número que escolhermos, esse número sempre terá um sucessor. Notem que aqui nao importa muito o fato de nossa natureza nao nos permitir "observar" a infinitude do conjunto, pois o fato de saber que todo número natural tem um "potencial" sucessor já é o suficiente para qualquer uso que venhamos a fazer desses números.

Outro exemplo mais interessante é a probabilidade de caras e coroas em lancamentos de moedas. Vamos trabalhar esse exemplo cuidadosamente de agora em diante. Considerando uma moeda convencional, qual a probabilidade de se obter cara ou coroa em um lancamento aleatório dessa moeda? Sem precisar de nenhum conhecimento prévio em matemática ou teoria da probabilidade, todos diriam "meio a meio", ou nao?! Por que?! O que nos faz acreditar que na verdade é assim? A intuicao nos diz que é assim porque faz sentido que seja assim, ou seja, nao há nada que aparentemente favoreca cara ou coroa, certo? Correto, mas insatisfatório, pelo menos pra mim e espero que pra vcs também. Por que insatisfatório? Digamos que eu tire uma moeda do meu bolso, faca 10 lancamentos e anote o número de ocorrencias de caras e coroas. Considerando que a moeda é justa, ou seja, nao favorece caras ou coroas, eu observo 8 caras e 2 coroas. Peraí, parece ter alguma coisa errada aqui, nós concordarmos que a chance de dar cara é 50% , mas o que o meu pequeno experimento me diz é que a nossa intuicao parece estar incorreta e que na verdade a chance de cara é 8/10 e portando 80%. Temos um pequeno dilema aqui. Para isso existe a investigacao científica, e ela nos mostra que há uma razao mais forte por trás da nossa intuicao, que por sinal está correta. E pra justificar o fato de sabermos que o resultado dessa experiencia boba é meio a meio, precisamos mais uma vez desse carinha chato chamado infinito.

Sei que ainda temos várias perguntas em aberto, mas como em qualquer série, as respostas sao deixadas pro final. Prometo concluir o raciocínio no próximo e último post da saga.